quarta-feira, junho 14, 2006

1986. Andava na escola primária. Exactamente na primeira classe.
Vivíamos numa vivenda perto de Monte Gordo, a 5 Kilómetros de Vila Real de Santo António.
Lembro-me das grandes portadas em vidro que tornavam todo o espaço luminoso, da lareira qua a minha mãe teimava em não acender por nós sermos pequenas. Dos inúmeros vasos que a minha mãe coleccionava, da cozinha cor-de-laranja, da sala preta e vermelha, do cheiro a terra quando chovia, do Sol, da Ana e da Beta que vinham passar férias, das férias de Verão e das voltas de bicicleta, dos joelhos esfolados... e mil coisas mais...
Mas sobretudo lembro-me da cama dos meus pais.
A minha mãe entrava no trabalho às 8. O meu pai às 9. A minha mãe arranjava-me, dava-me o pequeno almoço e saía deixando-me um beijo na bochecha. Entretanto eu esperava pelo meu pai, que me prometia não se atrasar para me deixar na escola às 8 e meia.
O meu pai sempre teve um problema com horários, que acho que acabei por herdar.
Chegava à escola quase às nove da manhã. Entretanto tinha esperado uma eternidade pelo meu pai.E havia um ritual da espera:deitava-me e empurrava os joelhos para o peito para ver se aquela dor de barriga passava.Eram os meus nervos,pequeninos, já a prever o ralhete que a professora me ía dar, por ser sempre a última a chegar à escola.
Dessas temporadas de espera lembro o Por Este Rio Acima do Fausto, que o meu pai ouviu insistentemente durante uns longos meses, sendo que acabou por ser um dos meus discos preferidos de sempre.
O meu pai acabou por pedir à D. Luísa para não me ralhar, que a culpa dos atrasos era dele e que eu dependia dele para me trazer à escola.
Hoje lembrei-me disto... e tive saudades .


5 comentários:

ana marta disse...

"Por este rio acima
Deixando para trás
A côncava funda
Da casa do fumo
Cheguei perto do sonho
Flutuando nas águas
Dos rios dos céus.."

eu sei que tu gostas canino! assim como eu...

miguel. disse...

Pobre velha música!
Não sei por que agrado,
Enche-se de lágrimas
Meu olhar parado.

Recordo outro ouvir-te.
Não sei se te ouvi
Nessa minha infância
Que me lembra em ti.

Com que ânsia tão raiva
Quero aquele outrora!
E eu era feliz? Não sei:
Fui-o outrora agora.

Fernando Pessoa

ana marta disse...

a nostalgia da infância. eu tenho muitos flashbacks dela e muitas vezes vontade de reviver os sons antigos, os cheiros da meninice. mas o tempo passa e ainda bem que há nostalgia. Quer dizer que houve bons momentos :)

Cinnamon disse...

as recordações de infancia sao preciosas. enquanto as vivemos n deixam de ser uma banal rotina mas quando olhamos para elas hj sao deliciosas e toda aquela visão do mundo de baixo para cima. tudo é maior que nós e nós somos aquele ser pequenino de olhos abertos a gravar imagens na memoria mais recondita..

JN disse...

e eu lembrei-me da felicidade que sentia pairar sobre cabelos despenteados e bochechas coradas em tempos de infância.
lembrei-me de quando tive de decorar "O barco vai de saída" para estreia teatral.
lembrei-me da forma como o Diogo Soares me fascinava.
lembrei-me que adormecia a rir e acordava a sorrir...

lembrei-me do Fausto.