Hoje vai a votos na Assembleia da República a proposta socialista de convocação de novo referendo sobre a despenalização do aborto (até às dez semanas) em Portugal.
Com os votos a favor do PS, PSD e BE, a abstenção do CDS-PP e os votos contra do PCP e do partido Os Verdes, parece que é desta que o país será novamente consultado sobre este assunto, que há já muito devia estar resolvido.
Acho contudo que a alteração à lei do aborto não deve ser feita através de referendo. E é aí que me ponho ao lado do PCP.
Parece-me que a lei deve ser introduzida por via parlamentar e não por via referendária, adiando por mais uns meses um problema da saúde pública que o Eng.º Sócrates utilizou como bandeira para a campanha Socialista nas últimas legislativas e que só agora parece andar para a frente.
Sabem, aqueles que lutam pelo fim da criminalização do aborto, que do último referendo sobre a Interrupção Voluntária de Gravidez (IVG) não são boas as memórias. Nem dos feitos nem da campanha do PS que, na altura comandado pelo Dr. Guterres - bom católico, que fez campanha pela não despenalização- em muito ajudou à vitória do não. Ou melhor, à derrota do Sim.
Este é um problema que não deve ir a votos nem ser alvo de campanhas pró ou contra.
É de um atraso atroz que assim seja e revela a pequenez do nosso povo.
Num país em que pouco se investe em Educação Sexual, onde a Igreja ainda manda muito e onde milhares de cabeças ainda são infectadas pela doutrina arcaica da Santa Sé, as mulheres não têm liberdade para "dirigir" o seu próprio corpo. São vistas como criminosas, têm que carregar com o peso da ilegalidade e da clandestinidade do acto quando são expostas a um acto que já por si as violenta.
A mulher não deve ser julgada por ninguém e muito menos por qualquer instituição do Estado pelo simples facto de ter tomado uma opção que só a ela diz respeito.
Ninguém aborta por prazer (nem como a Dr. Zita Seabra escreve hoje no público-num artigo ridículo, mais ainda quando sabemos qual a postura da mesma face ao aborto aquando dos anos em que pertencia ao Comité Central do PCP- por não lhe agradar o sexo do nascituro).
Aquilo que o Estado deve então providenciar é uma lei inclusiva. Isto é, quem é contra a IVG continuará a sê-lo (como lei ou sem lei) e nunca optará pelo aborto. Quem é a favor e precisar de recorrer a este meio deverá ter do Estado as condições necessárias para garantir que o processo não causa mutilações ou danos físicos à mulher que praticou o aborto, além de que passará a ser acessível a todas as mulheres.
A lei vigente é hipócrita e classista, fazendo com que as mulheres com menos recursos económicos tenham que recorrer aos processos mais penosos (e que deixam mazelas psicológicas) para abortar, enquanto que aquelas com mais recursos podem sempre ir a Espanha ou a Inglaterra para resolver o problema sem pôr em risco a sua integridade física.
O recurso ao aborto é uma prática constante e real, tanto no nosso país como no resto do mundo. Resta-nos tentar minimizar as mazelas de quem a ele recorre, sem julgar, sem moralismos, com condições e respeito pela liberdade da escolha.
Uma vez ouvi dizer que se os homens abortassem o aborto nunca teria sido ilegal.
Vejamos se é desta.
2 comentários:
Cara Marta,
O meu voto é SIM. Porquê?
Fundamentalmente pelo respeito que me merecem todas as mulheres,quer as que votam sim ou mesmo as que votam contra.Mas acima de tudo,porque uma lei justa e equilibrada,pode e deve contribuir para que "o aborto de vão de escada".mortífero,senão acabe,pelo menos seja drásticamente minimizado.É um assunto sério,sem vencidos ou vencedores.
A lei por si não resolve tudo,sobretudo as mentalidades.Para isso seria necessário não uma lei,antes uma aposta na educação,no conhecimento,na razão natural das leis próprias da vida e da convivência que ela proporciona.
Tenho para mim que a ser aprovada esta proposta,todos nós vamos ter que nos confrontar com um novo conjunto de realidades.
Cumprimentos
pelo menos a proposta de referendo já passou, mas sem dúvida que muitos novos factores terão que ser equacionados como por exemplo a hipótese dos médicos se recusarem a levar adiante a interrupção... tenho muitas dúvidas acerca dos moldes sobre os quais esta lei(se aprovada) vai funcionar.
a ver.
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