terça-feira, janeiro 15, 2008

Dizia-me um grande amigo que quando se perde a inocência a vida ganha uma cor cinzenta. Leia-se a inocência como motor de arranque para o sonho - e bem vistas as coisas, e como dizia alguém, é o sonho que comanda a vida.
Dizia eu que nunca perderia a inocência e o sonho. Com os olhos abertos para o mundo achava que tudo era possível ... tudo desde que a força que nos impulsiona para o "novo" saísse cá de dentro, do fígado, do estômago.

No outro dia vi o que andei a adiar ver - que os meus olhos agora tendem a toldar-se de cinzento.
Mais grave é a nitidez com que aparece a desgraçada da evidência:

- A inocência não se perde, tiram-no-la.

Deixei a minha bolha em terras da Beira Litoral. Mudei-me para onde supostamente o oxigénio é menos rarefeito, por motivos óbvios de maior aproximação ao nível do mar.
"Sempre para Sul", dizia também esse grande amigo - "ir sempre para Sul".
Nada de mais errado, tenho eu percebido, com um ano de "sobrevivência" em terras algarvias.

Aqui chamam-se bimbos aos do norte (e o norte aqui é tudo o que fica acima do Tejo) e elitistas aos da capital, pseudos aos que sabem mais que nós e intelectuais aos que pura e simplesmete se interessam por alguma coisa.

O problema nasce quando só conseguimos apontar os problemas dos outros e não temos a capacidade de perceber os nossos próprios problemas. Aí começa a nossa pequenez.

Todas as semanas passo de uma terra pequena para outra maior, pelo menos em infra-estruturas. Saio da província para chegar às muitas provícias que habitam nas cabeças pequenas das pessoas da outra "banda", muito mais "cosmopolita" e com gente de "cóltura".

Certo é que nem todas as cabeças são províncias por aquela terra do Barlavento Algarvio, e seria muito injusto fazer uma afirmação destas.
Mas o grosso das pequenas cabecinhas é semelhante às dos novos ricos - modernos mas revestidos de uma camada de saloíce bacoca!

E quando se abrem as jaulas e as cabecinhas saem à rua comportam-se como pequenos animaizinhos - elas urram, gritam, riem como hienas porque são, em suma, necrófagos vivendo das vidas dos outros e com as suas pequenas cabecinhas cheias de coisinhas pequeninas como as suas próprias vidas.
E de hienas passam a perús, inchados do nada que são, porque quando olham para o lado deviam pelo menos ter a humildade de pensar que há olhos que já viram mais que os deles.
E é triste ver perús e hienas com cabeças pequeninas e vidas pobrezinhas que vivem em circuítos fechados e que não se lembram que o mundo é um colosso e não apenas a nossa rua ou o nosso bairro.

"Se achavas Coimbra provinciana vê bem se queres vir para aqui viver".
Mudo para o sítio de galináceos e de necrófagos. Mudo e passo bem por eles.
Não é por eles a mudança mas por uma força maior.
Tenho a calma de quem já conheceu as pessoas grandes e por isso não me sinto nunca sozinha.

Da inocência ainda guardo as cores e ainda vou pelo caminho acreditando.
O cinzento que vejo é o de alguns outros ... mas os meus pés não param pelas pedras na estrada.


6 comentários:

franksy! disse...

acho que essas hienas e esses perús existem em todo o lado...

mas congratulo-me por não costumar andar por essas capoeiras!

foge delas!
foge delas aí!
ou então,
VENHAM CÁ PARA CIMA!!!
[para junto dos bimbos!!!]

ana marta disse...

amiga ando a por muita coisa em causa e não sei que quero ficar aqui ... quero ir ter contigo !!! Podermos jantar juntos ou comer bolo franciscano ... tenho que resolver a minha vida ... e capoeiras a cheirar a cac de galinha é que não, nunca!

nrc disse...

Compreendo o que dizes, talvez porque tivemos percursos idênticos, e é claro que tento não me rever na descrição, embora faça parte dela. Não sou assim tão azedo porque a azia faz mal à acção...
Mas desde pequeno convivo com animais (o meu avô sempre teve um galinheiro) e por isso criei resistências. Espero sim que contribuas para inverter aquilo de que não gostas. bj

ana marta disse...

meu querido nrc:

tu não estás naquelas palavras (e tu sabe-lo). Tu pertences a uma máquina que pretende inverter a tendência. Na verdade e como diz a fRan fauna desta há em todos os lugares ... há que viver com ela mesmo.
O trabalho que tu e o resto dos "artificiosos" desempenham é um sinal de que nem tudo está mal e por isso é que é em vocês que me revejo!!

... quanto à fauna, é o que dizes, há que habituar ao som do cacarejo porque no fundo os cães passam e a caravana passa :)

um grande abraço!!!!

(ainda assim deste a ajuda para que o ínicio da minha mudança para sul fosse menos complicada ... e ainda cá ando. Agora sem as cervejinhas de fim de tarde!)

p.s. ando a tomar rennie para a azia ... aos poucos vai fazendo efeito!! ;)

franksy! disse...

Eu adorava que viesses ter comigo!!! Quanto mais perto de mim estiveres, mais feliz eu fico! É que o barlavento é mesmo longe…
Resolve a tua vida da melhor forma! Fiques onde ficares, estejas onde estiveres, gostarei sempre de ti!!!

sofi disse...

a vida é demasiado curta...um dia acordas e descobres que já se passou tudo, e tu não fizeste nada do que querias fazer...por outro lado, há um amigo meu que diz que nos tempos que correm a grande irreverência é sabermos o que queremos. E corrermos atrás disso.
Portanto, corre. Enquanto ainda tens pernas.